A palavra “hacker” é frequentemente associada à algo negativo, deturpador. O invasor de computadores e sistemas, capaz de roubar informações ou disseminar poderosos vírus digitais, conferiu ao termo “hacking” a fama de ilegal. Já o termo “growth” é implacável no seu significado e associa-se imediatamente à crescimento.
Com o avanço de tecnologias de análise e inteligência de dados batendo à porta dos departamentos de marketing, os termos se juntaram para formar o conceito de Growth Hacking Marketing. Para debater o assunto, a primeira edição de 2016 do Knowledge Exchange Sessions (KES) apresentou, no dia 15 de março, no SAP Fórum, em São Paulo, um dos maiores especialistas do mundo no tema: Ryan Holiday.
Aos 28 anos, o garoto prodígio nascido em Austin, no Texas (EUA), já publicou três livros e uma dezena de artigos sobre o que ele chama de “novo vice-presidente da marketing”. Para Ryan, o profissional dessa área tem hoje à disposição uma série de ferramentas e plataformas que alimentam estratégias com dados para que sejam mais assertivas. Com isso, o crescimento é inevitável. Essa é a essência do chamado Growth Hacking Marketing.
O conceito questiona sobre como os departamentos de marketing tradicionais operam. Em vez de muito planejamento, o Grouth Hacking Marketing propõe agilidade e possibilidade de erro. Em vez de poder centralizado, entram as decisões horizontais baseadas em dados.
A cultura grouth hacking
Holiday define o cenário fornecendo uma visão geral da cultura organizacional e do despertar para a economia conectada. Ele lista uma série de empresas bem-sucedidas que adotaram essa forma de trabalho – entre elas, Dropbox, Mailbox, Twitter, Facebook, Instagram.
Todas nasceram como startups com tecnologia na veia, mas, segundo o especialista, companhias conversadoras e tradicionais também são capazes de aplicar o termo. Para isso, Ryan Holiday enumera quatro passos a serem seguidos para que organizações implementem a cultura de Grouth Hacking Marketing:
PASSO #1: PRODUCT MARKET FIT
PMF (Product Market Fit) é o momento em que o produto e seus clientes estão em perfeita sincronia um com o outro, diz Ryan. E a melhor maneira de chegar a este objetivo é começar com um produto piloto e melhorá-lo com base no feedback. “Não tenha medo de lançar o produto e aprender com o seu público sobre as formas de melhorar o seu valor. Abrace o medo”, provoca Ryan.
PASSO #2: ENCONTRANDO SEU GROWTH HACK
Conheça o seu público. A compreensão de quem é seu público, como ele interage por meio do digital e toma consciência sobre o seu negócio são os principais atributos necessários. Ryan cita o exemplo do Dropbox: para lançar o produto os fundadores criam um vídeo de demonstração para explicar como usar o serviço. Mas ao invés de contratar uma empresa de alta produção, a Dropbox filmou o próprio vídeo e sabia onde postá-lo (ou seja, onde o seu público potencial estaria) e publicou no Digg, Slashdot e Reddit.
PASSO #3: SEJA VIRAL
O growth hacking é sobre o lançamento de seu produto de forma mais barata possível e de forma única e diferenciada de seus concorrentes. Para isso, se espalhar de forma viral é um componente central para isso. Desta forma, você vai compartilhar com seus usuários a responsabilidade de ajudar a divulgar. “Todo mundo quer lançar o próximo anúncio viral para espalhar o seu produto ou serviço, mas você está tornando o seu produto mais fácil para ser espalhado e o mais importante, até mesmo vale a pena falar sobre ele?”, questiona Ryan.
PASSO 4: RETENÇÃO E OTIMIZAÇÃO
No marketing tradicional, o profissional de marketing traz clientes potenciais. No mundo do growth hack marketing é da responsabilidade da área de marketing reter, compreender e interagir com seus potenciais clientes e converter esse cliente através do uso da análise de dado. Ao invés de gastar mais e mais dinheiro em geração de leads externos, o foco é a otimização interna de onde você pode aumentar a sua conversão de venda. O papel do growth hacking é otimizar o tráfego de entrada e o foco em retenção.
Mais do que trazer esse pensamento para dentro de suas empresas e processos, é preciso implantar no cerne das corporações, defende o especialista. “Muitas vezes a melhor pessoa para ser o líder de grouth hacker marketing dentro de uma empresa é alguém que já trabalha lá dentro e tem a capacidade de espalhar o conceito”, complementa.
Desafios
Para Ryan, é de fato mais fácil que empresas jovens, já nascidas na era digital, implementem o growth hacking marketing. No entanto, ele diz que empresas mais tradicionais que conseguirem navegar pela prática terão enorme vantagem competitiva. “É preciso pensar além das ferramentas e plataformas que as empresas sempre utilizaram. Existem novas maneiras de conhecer consumidores e interagir com eles. É preciso pensar fora da caixa de entrada do e-mail ou do desktop”, finaliza o especialista.
Mindset
Ao longo de toda a apresentação de Ryan Holiday, fica evidente que o tema Growth Hacking Marketing é extremamente novo. Sua aplicação é mais facilmente observada em empresas nativas digitais, que nascem sob a conjuntura líquida das startups. No entanto, incorporar o tema nas empresas mais tradicionais e de grande porte é imprescindível. A cultura de dados é algo que deve permear o marketing cada vez mais – seja pela riqueza de insights que eles proporcionam, seja pelo aumento dos dados rastreados. E isso será possível por meio de disposição em orientar estratégias para resultados mais assertivos. Grouth Hacking Marketing é ciência; não é mágica. “Quando falamos sobre Grouth Hacking Marketing, é muito mais sobre mindset para fazer a coisa acontecer do que técnicas e ferramentas específicas”, crava Holiday.
SESSIONS
Além do keynote de Ryan Holiday, o KES promoveu as já emblemáticas sessões de troca de conhecimento e informações, dividindo o grupo de executivos em cinco subtemas. Abaixo, um resumo dos principais pontos discutidos em cada um deles, nas palavras de seus mediadores:
# HACKER MINDSET
Geórgia Nicolau, jornalista e produtora cultural
“Existe uma dúvida que paira no ar em torno da palavra e da mentalidade hacker. O primeiro desafio é mudar isso. Discutimos muito sobre como fazer o growth hacking marketing dentro de empresas mais corporativas e de que forma essas companhias poderiam ter espaço para pensar de maneira mais livre e autônoma.”
# SENSE MAKING
Bruno Belardo, BuzzFeed Brasil
“Debatemos muito em torno do tipo de conteúdo que produzimos para marcas. Fala-se muito em como se adaptar a diferentes plataformas e hábitos de consumo de conteúdo. Desta forma, é importante criar conteúdo relevante para diferentes targets. Baseado em métricas, criamos mais conteúdo e cometemos menos erros. Nessa linha, a marca tem que aprender que não estará na linha de frente, mas sim no contexto. E não poderíamos ter deixado de falar sobre vídeos. É o formato mais poderoso e capaz de ser adaptado para diferentes plataformas.”
# TRADITIONAL INDUSTRY HACKED
Eduardo Bontempo, Endeavor e Geekie
“Falamos sobre como conseguir implementar uma cultura de desenvolvimento ágil e orientada a dados dentro de indústrias tradicionais. Um pouco da visão do que discutimos é que nunca pode ser algo top down e forçado. Isso acontece dentro de células pequenas e, na medida em que os resultados vão sendo gerados, os projetos vão crescendo. É preciso ainda lidar com a cultura do erro. Como tolerar e aceitar dentro de uma organização? Isso é algo que ao longo do tempo na Geekie temos aprendido a lidar.”
# CONSUMER EMPOWERMENT
Tina Louise, MyFitnessPal
“O Primeiro ponto é entender o público que eu quero atingir. É preciso recorrer às técnicas que estão no livro de marketing ou não foram utilizadas. Todas elas juntas foram importantes no nosso caso na MyFitness Pal. Entender o que os consumidores falam e dar a eles o poder de compartilhar informações é algo imprescindível”.
# MARKETING DO FUTURO
Leandro Herrera, Geekie
“Boa parte do que é o marketing do futuro começa quebrando dois muros: informação demora mais para fluir e produto demora mais a ser desenvolvido. A partir dessa quebra, é possível começar um modelo de transição em que as empresas podem terceirizar uma parte e conectar pessoas por projetos. O marketing do futuro é marketing de ciclos. É o marketing do enos planejamento e mais dados. Como trazer isso para empresas mais tradicionais? O Nubank é um exemplo de inovação em uma indústria super conversadora.”
Foto: Eduardo Lopes