Audio Experience: como e por que investir em branded podcasts

Popularidade dos programas de áudio representa oportunidade para as marcas dialogarem com as pessoas de forma menos invasiva

Nos Estados Unidos, metade da população com mais de 12 anos já ouviu podcast. No Brasil, não se chega a tanto, mas esse tipo de programa já é consumido por 40% dos usuários de internet. Não à toa, as marcas exploram cada vez mais esse canal para se relacionar as pessoas. As iniciativas mais bem sucedidas costumam ser realizadas em parceria com reconhecidas empresas de comunicação e oferecem conteúdo relevante para os ouvintes – procurando reforçar os valores da marca de forma menos invasiva do que a publicidade tradicional.

Confira projetos inspiradores na área, o potencial para as marcas e alguns dos principais desafios a vencer.

Um mercado em expansão

No Brasil, 50 milhões de pessoas já ouviram podcast e demonstraram interesse por esse tipo de programa (cerca de 40% dos 120 milhões dos usuários de internet). Outros 28% nunca ouviram, mas sabem do que se trata. Os dados são baseados em entrevistas com 2 mil pessoas, conduzidas pelo Ibope, e divulgadas na Maratona Piauí CBN de Podcast, realizada em maio deste ano.

Na apresentação do estudo, Marcia Cavallari, CEO do Ibope Inteligência, afirmou que esses números mostram o potencial de crescimento dos podcasts no Brasil. Principalmente quando se toma como referência o cenário observado nos Estados Unidos, onde o consumo desse tipo de produto vem crescendo ano após ano.

Pesquisa da Edison Research nos EUA, a partir de 5.500 entrevistas com pessoas maiores de 12 anos, revelou que 70% sabem o que é um podcast, enquanto 51% já ouviram um programa do tipo. Entre os que ouviram podcast nos últimos 30 dias, o percentual era de 24% em 2017, subiu para 26% em 2018, e chegou a 32% em 2019 (o que representa cerca de 90 milhões de pessoas).

Perfis e hábitos de consumo

Os podcasts são mais populares entre os mais jovens. No Brasil, quase metade (47%) dos consumidores de podcast com idade entre 16 e 24 anos costumam ouvir esse tipo de programa pelo menos uma vez por semana. Nos Estados Unidos, pessoas com idade entre 12 e 24 anos representam 40% dos consumidores que ouviram podcast no último mês.

Segundo a Edison Research, entre os principais motivos para consumir regularmente podcasts estão aprender coisas novas, se inspirar e se atualizar sobre os últimos assuntos. Boa parte dos ouvintes buscam entretenimento, enquanto outros procuram companhia. Há, ainda, os que querem relaxar ou escapar do cotidiano.

A maioria descobre podcasts a partir de buscas na internet (73%), das mídias sociais (67%) e de recomendações de parentes e amigos (66%). Um grupo significativo conhece novos podcasts a partir de anúncios em outros programas de áudio (54%) e de serviços como iTunes e Google Play (45%).

Um dos fatores que explica a popularidade crescente desse tipo de produto é o fato de que é possível escutar podcasts enquanto se faz outras atividades. Essa característica foi destacada de maneira positiva por 87% dos consumidores de podcasts nos Estados Unidos entrevistados pela Edison Research. Entre as principais atividades a que se dedicam enquanto ouvem esse tipo de programa estão: executar tarefas domésticas, dirigir, cozinhar, caminhar, se exercitar e usar o transporte público.

Pick me up | Lyft

As trajetórias e sonhos de motoristas da Lyft são a essência do podcast Pick me Up, produzido pela empresa em parceria com a Gimlet Creative. A host Mariah Smith, comediante e escritora, apresenta motoristas que trabalham para a Lyft e seus projetos de vida para além do volante – como um escritor que busca publicar seu primeiro livro infantil, dedicado ao irmão, que faleceu recentemente. O programa dá um empurrãozinho para que esses sonhos se tornem realidade.

Principais desafios

O primeiro desafio para as empresas que pretendem explorar o universo dos podcastas é fazer com que seu produto seja conhecido e experimentado pelo público. No Brasil, segundo a pesquisa do Ibope, 32% dos 120 milhões de usuários de internet nem sabem o que é um podcast, enquanto 28% sabem do que se trata, mas nunca ouviram. Nos Estados Unidos, as entrevistas da Edison Research com pessoas que entendem o que é um podcast, mas nunca chegaram a escutar um programa, revelou que muitas (35%) não sabem onde encontrar esse tipo de produto.

A pesquisa da Edison Research também sinaliza outra barreira a ser vencida: a disputa pelas horas livres das pessoas – que, na verdade, estão cada vez mais ocupadas. A falta de tempo é apontada por metade (51%) dos entrevistados que não ouvem podcast como uma das razões para não consumirem esse tipo de produto.

A crescente concorrência pelo tempo dos consumidores foi um dos temas discutidos no MIPCOM 2019, um dos maiores eventos do setor de entretenimento no mundo, realizado no mês passado, em Cannes (França). Em sua apresentação, Tim Mulligan, vice-presidente executivo da MIDia Research, destacou que gigantes do setor de entretenimento digital, como Netflix, hoje têm entre seus principais concorrentes as horas de sono das pessoas. “Em mercados maduros, o crescimento agora se dá às custas de outro. A pessoa precisa abrir mão de alguma coisa para passar a consumir outra”, destacou.

Nesse contexto, é crucial oferecer conteúdo relevante para as pessoas. Na pesquisa da Edison Research, 49% das pessoas que não ouvem podcast afirmaram que não consomem esses programas porque eles não apresentam nada que não se possa achar em outro lugar, enquanto 36% afirmaram que esse tipo de produto não cobre assuntos que lhes interessam.

Seu forte é ser mulher | Buscofem

Projeto de branded content da Buscofem, que inclui um podcast realizado em parceria com a Trip/Tpm. Nos episódios, apresentados por Sarah Oliveira, as protagonistas – como a rapper Preta Rara (foto acima) e a DJ e jornalista Flávia Durante – dividem com os ouvintes suas histórias e, em particular, como se relacionam com o corpo e enfrentam tabus ainda associados à menstruação. Dessa forma, a marca estabelece uma conversa mais próxima com suas consumidoras (e potenciais consumidoras), baseada em temas relevantes para as ouvintes e nos valores que a marca defende, e não nas propriedades do produto.

Potencial para branded content

Se tanta gente está ouvindo podcast e esse mercado continua a crescer, é natural que as marcas queiram explorar esse espaço, indo até onde os consumidores estão. A questão é como fazer isso com criatividade e efetividade, considerando as oportunidades e desafios que esse universo representa.

Em artigo publicado recentemente, The New York Times provocou: “com a crescente popularidade dos podcasts, não surpreende que as empresas estejam produzindo o seus próprios programas, mas sim o fato de que as pessoas estão, de fato, ouvindo esses podcasts”.

The Sauce | McDonald’s

Inspirado no megasucesso Serial, The Sauce surgiu a partir de uma enrascada em que o McDonald’s se meteu ao relançar o molho Szechuan Sauce, mencionado no programa de TV Rick & Morty. A receptividade dos consumidores superou (e muito) a demanda esperada pela marca. E o produto não chegou pra quem quis. Indignados, os clientes esbravejavam nas lojas. Numa inventiva estratégia para reverter essa frustração, a marca lançou um podcast supostamente “investigativo”, em parceria com Gizmodo e Onion Labs, que buscava esclarecer o sumiço do molho das lojas, em meio a tanta procura. Um dia após o lançamento, The Sauce figurava entre no ranking dos 100 podcasts mais populares no iTunes – e, sim, a marca reabasteceu as lojas com o produto.

Para investigar o potencial dos podcasts para as marcas e identificar o que mais funciona nessa área, a BBC encomendou uma pesquisa para a Neuro-Insight, com base na neurociência. O resultado está no estudo Audio: Actived, divulgado no final de setembro. Confira alguns insigths do relatório:

. Segundo a pesquisa encomendada pela BBC, o perfil dos podcasts, que geralmente se assemelha a uma conversa e gera intimidade com os ouvintes, aumenta o engajamento dos clientes com relação às marcas.

. O estudo também reforça a capacidade de as marcas chegarem, por meio de podcasts, a clientes que evitam anúncios, mas são potenciais consumidores dos seus produtos e serviços.

. De acordo com os pesquisadores, o fato de muitas pessoas manterem o cérebro ocupado com uma outra atividade enquanto ouvem podcasts aumenta a possibilidade de as mensagens das marcas se destacarem e serem assimiladas. O estudo registrou, entre esse grupo, um aumento de 18% no engajamento, de 22% na memória de longo prazo sobre o conteúdo, e de 40% na intensidade emocional.

. O estudo ressalta que as pessoas costumam ouvir podcasts em momentos que não representariam, tradicionalmente, oportunidades para a publicidade. Dessa forma, as marcas podem chegar até as as pessoas em situações que antes pareciam ser inacessíveis ­– o que representa uma grande oportunidade comercial.

. Outro fator positivo destacado é o fato de que os ouvintes de branded podcasts desenvolvem associações subconscientes com a marca, a partir de palavras ouvidas no programa. É citado um exemplo em que a palavra “inovadora” foi mencionada 12 vezes durante um episódio. Posteriormente, os ouvintes instintivamente ligaram a marca a essa imagem de inovação.  

Where the world is moving | OFX

A fintech australiana OFX se juntou à BBC Story Works para produzir um podcast chamado “Where the world is moving”, apresentado pelo futurista Ross Dawson. A série de episódios aborda como o mundo está mudando e como esses movimentos impactam diretamente a vida das pessoas, a colaboração e o progresso humano. Em entrevista a The Drum, Lucy Allen, head de marketing da OFX para Ásia-Pacífico, revelou que, para a marca, era importante trabalhar com uma empresa de mídia respeitada globalmente, como a BBC, sem perder de vista a voz da própria organização. Para ampliar o alcance, foram usados canais complementares para divulgar o podcast, como mídias sociais e rádio.