Hiperconectividade e sustentabilidade movem inovação na indústria automotiva

Depois de queda nas vendas em 2020, setor espera crescimento nos próximos dois anos. Experiência do consumidor, responsabilidade ambiental e diversificação dos serviços estão entre as prioridades

O impacto da pandemia de Covid-19 sobre a indústria automotiva se materializou em queda de 16% nas vendas globais de veículos leves e SUVs, em 2020, segundo dados da IHS Markit. No Brasil, essa perda foi maior, chegando a 26,7%, de acordo com dados da German Association of the Automotive Industry (VDA).

A boa notícia é que há previsão de crescimento nos próximos anos, em torno de 9% em 2021 e de 5% de 2022. Quem conseguir se reposicionar e emergir da crise, vai encontrar uma série de novas oportunidades de negócios, impulsionadas pela migração de parte importante da jornada de consumo para o meio digital e pela busca por diversificação das receitas. Confira, a seguir, movimentos que movem a inovação do setor e sinalizam tendências para os próximos anos.

Serviços de Mobilidade

A indústria automotiva global movimentará pouco menos de US$ 9 trilhões em 2030, segundo dados da Statista, sendo que apenas 38% desse valor virá da venda de veículos novos. Além de a experiência do cliente parecer tecnologicamente desatualizada em comparação àquela oferecida por outros setores (como o financeiro), os mais jovens demonstram menos interesse em possuir um carro. “Eles preferem novas opções de mobilidade, mais convenientes, flexíveis e baratas”, afirma Cassio Pagliarini, consultor associado da Bright Consulting, especializada no setor automotivo.

A saída, para as montadoras, é tornarem-se provedoras de soluções de mobilidade. No Brasil, a GM, há algum tempo, vinha testando o modelo de car-as-a-service, e a Toyota, o de carro compartilhado, com aluguel por dia ou hora. Cresce, agora, o serviço “por assinatura”, no qual o cliente paga uma mensalidade para usar o veículo. De acordo com o Digital Life Index, 48% dos entrevistados considerariam essa opção quando fossem comprar um carro novo.

De setembro de 2020 para cá, a modalidade foi lançada no Brasil por Audi, Volkswagen, Renault e FCA. “Flua!, nossa empresa de carro por assinatura, é uma das abordagens que estamos trabalhando para atender a um novo perfil de cliente”, afirma Fernando Battaglia, CMO para a América Latina da Stellantis (empresa resultante da fusão de Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën). O tamanho do mercado de veículos por assinatura pode ainda ser uma incógnita, mas é certo que se trata de um segmento em rápida expansão.

Hiperconectividade

De acordo com o Digital Life Index, 93% dos 7 mil entrevistados em 10 países querem que seu próximo carro tenha pelo menos uma funcionalidade conectada e 50% estariam dispostos a pagar mais por isso. Confira as opções mais valorizadas, segundo o estudo:

. Backup Camera – 64%
. Avançado sistema de navegação/GPS – 59%
. Bluetooth – 51%
. Conexão Wi-fi ou hotspot: 42%
. Self parking ou estacionamento assistido – 41%
. Alerta de serviço emergencial – 37%
. Conexão a serviço digital ou streaming – 33%
. Comandos de voz – 29%
. Atualização remota de software – 29%
. Interrupção do funcionamento de forma remota – 27%

Projeto de carro compartilhado M.Vision X, da Hyundai Mobis, transforma janelas em telas para exibição de conteúdo imersivo.

Experiência do consumidor

Devido às mudanças no comportamento de consumo, melhorar continuamente a experiência do consumidor será um ponto crítico daqui por diante, mesmo depois de superadas as dificuldades geradas pela pandemia. Ter uma boa presença online pode ser um game changer para os negócios. Por isso, mais ferramentas online serão aperfeiçoadas e incorporadas ao processo de compra e venda.

“Nossa tarefa é, por um lado, prover ferramentas para a jornada do consumidor ser a mais interessante possível. Ao mesmo tempo, temos que fornecer recursos ao concessionário para que ele seja um ponto de referência nessa jornada”, analisa Battaglia. “É preciso contar com toda uma estrutura de tecnologia, dados e informação para que não haja quebra de expectativa no momento da passagem de um ponto a outro da jornada”.

No Reino Unido, a Audi unificou a experiência no mobile e no desktop, com tecnologia IBM, e reporta crescimento de 59% na geração de leads em 2020.

Veículos elétricos e autônomos

A mudança da matriz energética dos carros do combustível fóssil para a eletricidade é considerada um movimento irreversível. Porém, começam a surgir questionamentos sobre veículos movidos à bateria.

“O carro eletrificado é solução para alguns mercados, porque tem mais eficiência energética, mas não para todos”, aponta Pagliarini. É o caso dos países onde a eletricidade é gerada a partir de fontes poluidoras, como petróleo e carvão. Além disso, o segmento precisa de subsídios, por conta do (ainda) alto custo unitário. Sem contar o problema do descarte: o que fazer com as baterias usadas?

Outra novidade muito celebrada, o carro autônomo, também não será viável num futuro próximo. A tecnologia existe, mas só funciona em condições ideais, e o mundo real é bem mais complicado. O que veremos é os carros passarem a “se dirigir” sozinhos cada vez mais.  Já temos automação de nível 1, como o piloto automático, que controla velocidade, distância do veículo à frente, faz curvas e mantém o carro dentro da faixa de rolamento. “Conectividade e autonomia de condução são as tecnologias que veremos evoluir mais rapidamente no futuro breve”, aposta Battaglia.

Sion EV, da Sono Motors, opera com bateria elétrica e, também, por meio da captação de energia solar. O protótipo foi apresentado neste ano, com pré-venda.

Parcerias estratégicas

Muitas montadoras já entenderam a dificuldade de encarar tantos desafios sozinhas e, por isso, mostram maior disposição em colaborar com parceiros para desenvolver soluções inovadoras. Considerando-se o volume de investimento necessário para avançar em conectividade, autonomia, eletrificação e compartilhamento, faz sentido que os players da indústria, em vez de competirem uns contra os outros, trabalhem em conjunto para encontrar soluções que sirvam a todo o mercado.

A Volvo Cars lançou recentemente o Portal de Inovação, liberando o acesso a recursos e ferramentas para que desenvolvedores externos criem serviços e aplicativos para os automóveis da marca, a fim de torná-los mais seguros e aumentar as possibilidades de personalização por parte do cliente.

Já a FCA (agora Stellantis) aderiu no final de 2020, ao projeto IPT Open Experience, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas. Trata-se de uma plataforma criada para desenvolver e incorporar inovações tecnológicas aos negócios. O foco da Stellantis na parceria é a aceleração do desenvolvimento de tecnologias para o carro conectado, com ênfase na validação dos sistemas de infotainment e conectividade.