Cannabusiness: ativismo abriu caminho para indústria

Um dos nomes aguardados no SXSW deste ano, Kris Krane, presidente da 4Front Ventures, defende que os ativistas devem ficar à frente da regulamentação da Cannabis

O mercado canábico representa mais de US$ 20 bilhões nos Estados Unidos. Nos próximos  cinco anos, estima-se que esse setor deve movimentar até US$ 200 bilhões em produtos relacionados à Cannabis. Para se chegar a esses números, houve um grande trabalho dos ativistas em defesa da legalização do cultivo e do consumo da planta. E agora é hora de reconhecer esse esforço e reparar as injustiças cometidas contra eles. É o que defende Kris Krane, presidente do 4Front Ventures, fundo de investimentos e de gerenciamento de negócios da Cannabis.

Krane seria um dos speakers do SXSW 2020, em painel sobre a relação entre o ativismo e a indústria nesse setor. O evento foi cancelado devido à pandemia de Covid-19, mas nós conversamos com ele sobre o novo perfil da indústria canábica e dos ativistas que contribuíram para desenvolvê-la. “No início, os ativistas disputavam o mesmo número de patrocinadores, que eram poucos. Hoje, existe investimento vindo tanto de empresas como de pessoas físicas, e as conversas com os legisladores alcançaram um novo nível”, diz.

Antes de estar do lado mais “business” da indústria canábica, Krane esteve envolvido por muitos anos com o ativismo em prol da legalização e regulamentação da Cannabis. Ele diz ter consciência de que nenhuma das oportunidades de negócios que vemos hoje teria sido possível sem o esforço e a dedicação de tantos ativistas que vieram antes dele. “Começa lá atrás, em 1996, com os movimentos populares liderados por Dennis Peron”, recorda, citando o empresário e ativista norte-americano que é tido como o pai da maconha medicinal.

“Se as pessoas podem produzir a própria cerveja em casa, por que não poderiam cultivar a própria maconha?”

Por ter atuado em ambos os lados “do balcão” – como ativista e como investidor –, Krane tem um ponto de vista privilegiado para avaliar o atual cenário do mercado canábico, no qual ainda existem choques entre os princípios dos ativistas e os interesses dos empresários. Ainda que ambos busquem a ampla legalização e regulamentação da Cannabis, seja para derivados da planta ou canabinóides sintéticos, há sérias divergências e desconfianças entre eles.

“Há quem veja os ativistas como pessoas benevolentes demais, sem clareza sobre os desafios do mercado e do mundo real. Ao mesmo tempo, há quem enxergue os empresários da indústria canábica como predadores dos resultados obtidos após décadas de ativismo”, diz Krane. Diante desse impasse, ele acredita que uma solução seria ceder para os ativistas a liderança sobre a legislação e regulamentação, considerando que os interesses da indústria podem se tornar perigosos, por conta do seu forte apelo voltado ao lucro.

É o caso das discussões sobre a legalidade do cultivo de Cannabis para consumo próprio. Os empresários tendem a defender a proibição do cultivo doméstico, na contramão do que pregam os ativistas. Para Krane, isso não faz o menor sentido: “Se as pessoas podem produzir a própria cerveja em casa, por que não poderiam cultivar a própria maconha?”.

Para o investidor, os “cultivadores domésticos” seriam exatamente os consumidores mais entusiastas, que tenderiam a se interessar por produtos canábicos mais premium, como strains específicos ou versões manufaturadas mais difíceis de se obter em uma produção caseira (strain é como se chama uma variedade da planta com efeitos diferenciados). “O que os ativistas querem é que exista um mercado livre e aberto, acessível também para os pequenos empresários, e que possa promover a equidade social. É nisso que eu também acredito”, defende.