Blockchain promete consenso descentralizado e fim dos intermediários

Sistema pode revolucionar a relação entre pessoas e empresas a partir do compartilhamento do controle de transações digitais

Criada logo após a crise econômica de 2008 a partir do ideal quase anárquico de compartilhamento total do controle sobre transações, a Blockchain promete revolucionar a relação entre pessoas e empresas e sua indústria – seja ela qual for. Quase dez anos depois de surgir, foi o assunto de ao menos 46 painéis no último SXSW, num verdadeiro mosaico de suas possíveis aplicações e previsões para o futuro que incluem, possivelmente, um novo ponto de pressão (ou oportunidade de amadurecimento) para o mercado de marketing e comunicação.

Blockchain é um sistema de armazenamento de dados compartilhado e descentralizado (ou seja, sem um controle central como uma empresa ou um órgão governamental) que cresce conforme novos dados são inseridos e validados, por meio de criptografia robusta, por entidades virtuais conectadas em rede. Essa conexão se estabelece por meio de arquivos (instalados em servidores ou mesmo no seu computador) que se alteram igualmente, em rede, a cada transação feita na Blockchain – num mecanismo baseado em criptografia robusta e compartilhamento em rede que garante segurança a todos os envolvidos. “A Blockchain atua como um juiz numa partida de futebol, permitindo aos demais presentes em campo jogar”, compara Brian Behlendorf, diretor executivo da Hyperledger, iniciativa da Linux Foundation focada em Distributed Ledger Technology (DLT), nome “científico” do Blockchain.

O fim do intermediário

Por mais utópico que pareça, este é um modelo computacional que permite colocar uma série de transações humanas – da compra de um imóvel à proteção de dados pessoais – numa rede de “consenso descentralizado”, em que não há uma autoridade única.

Com isso, o Blockchain coloca em cheque os “middle man” de qualquer indústria, já que uma série de funções que lhes conferem valor podem ser delegadas à validação de uma rede neutra à prova de invasões (graças à conexão em rede que assegura que todos estejam informados sobre tudo o que acontece, mas mantendo privacidade graças à criptografia complexa).

A aplicação prática de Blockchain vem sendo estudada em diversos setores, como o financeiro (para permitir transações de forma automatizada), cadeia de suprimentos (para rastrear um produto desde sua origem até o consumidor final), saúde (prontuários médicos de um mesmo paciente ou as licenças de um profissional de saúde mantidos na Blockchain), jornalismo (há uma startup, a Civil (vídeo abaixo), que busca valorizar o bom jornalismo usando a descentralização do controle de padrões éticos) e, claro, marketing & comunicação.

https://www.youtube.com/watch?v=7LlvFFDq-DU

Blockchain e marketing

 Na nossa indústria, há duas aplicações mais próximas de se materializar. A primeira é a garantia de que a mídia online comprada está sendo entregue de verdade para o público oferecido: marcas poderão rastrear se humanos estão sendo impactados (e não bots colocados no ar para entregar métricas infladas). A segunda diz respeito aos dados de consumidores. A Blockchain promete maior controle a cada um de nós no que diz respeito a como nossos dados serão usados por empresas, uma vez que caberá ao indivíduo decidir cedê-los ou não ao mercado. Isso pode, como consequência, criar uma relação mais saudável e menos desigual entre pessoas e instituições, consolidando a máxima muito repetida no SXSW 2018: “Dados são o novo petróleo”.

Nova fronteira econômica

Ainda que de desenvolvimento nebuloso, não há dúvidas sobre o potencial de impacto da Blockchain na economia: segundo o Fórum Econômico Mundial, até 2027 nada menos que 10% do PIB global estará armazenado em criptomoedas (que existem graças à Blockchain). Além desses dados, há uma crença compartilhada em diferentes falas na capacidade da Blockchain em trazer transparência e agilidade para a vida conectada. Para os mais otimistas, essa é também uma chance de diminuir desigualdades e incluir num modelo horizontal quem sempre viveu à margem da sociedade – como refugiados e populações periféricas sem acesso ao sistema econômico.

E é justamente essa quase utopia que coloca o uso da Blockchain em perspectiva: estamos diante de uma tecnologia que desafia a forma como nos organizamos na economia capitalista e, consequentemente, em sociedade: todos vivemos sob a orientação de algum tipo de controle mais ou menos centralizado. O protagonismo da Blockchain significará abrir mão de poder, e aí qualquer previsão passa a precisar de análise cautelosa.

O que sabemos, no entanto, é que colaboraçãoserá palavra-chave para grandes companhias e instituições consolidadas, como bancos centrais e governos. “Vejo a Blockchain como a internet em seu estágio de desenvolvimento no anos 80”, diz Amber Baldet, executiva que lidera as iniciativas de Blockchain no banco JPMorgan. Em linha com Baldet, Julian Hosp, cofundador da fintech Ten-X, que busca popularizar o uso de criptomoedas, avalia que o ceticismo atual encontra paralelos na história: “Vinte anos atrás muitos não entendiam o conceito de estar on-line”, afirmou.