Desafiadas a reinventar seus modelos de negócio, organizações jornalísticas vêm percebendo que a gestão de produtos é algo decisivo para a sustentabilidade de suas operações. Essa questão seria abordada em um dos painéis do ISOJ 2020, International Symposium on Online Journalism, que seria realizado em abril, em Austin (EUA), e agora ganhará uma versão online. Reunimos alguns dos principais insights sobre o tema, a partir de entrevista com a professora Cindy Royal, que coordenaria essa sessão no evento. Ela é gestora do Media Innovation Lab, na School of Journalism and Mass Communication, Texas State University.
Missão: criar produtos digitais
Para a professora Cindy Royal, a primeira coisa que as redações precisam fazer é reconhecer que sua missão é criar produtos digitais. “Se as redações continuarem operando em um modelo tradicional, no qual reportagem e edição são as principais funções, estarão perdendo a oportunidade de implementar product thinking”, afirma.
Ela enfatiza que é necessário ter profissionais com competência para gerir esses produtos e integrá-los à missão da organização – sejam produtos midiáticos diretamente voltados para a audiência (como um site, um app, um bot ou uma estratégia de mídia social), seja para uso interno (como sistemas de gestão de conteúdo ou ferramentas de análise).
O objetivo é fazer com que esses produtos despertem o desejo de serem consumidos e gerem valor – o suficiente, por exemplo, para que as pessoas se engajem, compartilhem e desejem pagar por eles. Essa é uma métrica de sucesso na era da Post-Peak Attention Economy, em que a indústria de mídia e entretenimento concorre até com as horas de sono das pessoas. Tudo isso, naturalmente, alinhado à missão, à responsabilidade jornalística e ao valores de cada organização.
The Texas Tribune (EUA), organização jornalística sem fins lucrativos, é referência na diversificação de produtos e receitas (veja a seguir).
Mindest da inovação
Outro grande desafio das redações, nesse contexto, é formar equipes com competências e perfis integrados às novas demandas dessa indústria. “As organizações jornalísticas e as escolas de jornalismo precisam desenvolver competências em código, engajamento de audiência, estratégias de mídia social e análise de dados, entre outras. Precisam contratar pessoas com o mindset da inovação, comprometidas com um aprendizado contínuo e com a experimentação”, defende.
A gestão de produtos digitais também requer profissionais que entendam o valor da colaboração e da empatia. E, mesmo que não precisem dominar determinadas ferramentas e programas, essas pessoas têm de abraçar a cultura da tecnologia, orientada por dados. Isso é essencial para que as organizações sejam mais ágeis em suas respostas às transformações do mercado.
O exemplo do Texas Tribune
Data-driven, audience-oriented, product-focused: é isso o que se espera das redações na economia digital. E uma das principais referências, nesse sentido, é The Texas Tribune, organização jornalística sem fins lucrativos, com sede em Austin, muito focada no engajamento da audiência, na inovação jornalística e na diversificação das fontes de receita.
O veículo conta com 80 profissionais na redação, mais de 4 mil assinantes e uma audiência de mais de 2 milhões de pessoas por mês, em suas várias plataformas. Entre as principais fontes de receita estão doações (individuais e de fundações), patrocínios, eventos e memberships.
Uma de suas mais recentes iniativas é The RevLab, com foco na identificação e compartilhamento de práticas que contribuam para a geração de receitas nas redações e em experimentos com novos produtos e processos. Trata-se de um projeto de US$ 4 milhões e duração de três anos, parcialmente financiado pelo Facebook Journalism Project.