Análise: o conceito do esforço zero

Como se preparar para um consumidor que busca e exige cada vez menos catracas para se relacionar com sua marca, produtos e serviços?

A tecnologia – a internet dentro disso – mudou tudo. Transformou parâmetros, conceitos, estratégias, métodos. Mas uma coisa é inegável: cada vez mais a gente quer ter menos trabalho para realizar as coisas. Qualquer tipo de coisa. É o conceito que se aproxima do chamado esforço zero. O consumidor deixa de se preocupar com atividades e tarefas – das mais complexas às mais rotineiras – porque a cada dia surge algo novo que resolva problemas pra ele.

Uma das grandes viradas de chave foi a mudança do seletor de canais da televisão para o controle remoto. E, por mais que pareça simples – especialmente para quem é jovem e está lendo este artigo – isso foi uma revolução e tanto. Afinal, as pessoas passaram a zapear, não ficavam mais presas a um canal por preguiça de levantar para trocar de emissora.

Agora, imagine o contexto: já pensou no fechamento de balanço financeiro de uma empresa de grande, médio ou até pequeno porte sem o Excel da Microsoft? Sem suas fórmulas automáticas e mágicas? Sem os diversos softwares integrados do sistema financeiro que permitem extrair os dados e analisá-los? Consegue pensar em tudo isso acontecendo na mão? Aquele pessoal da contabilidade virando noites e noites, fazendo contas de 10 casas decimais depois da vírgula naqueles blocos amarelos de anotação?

Hoje, aquela dúvida que surge sobre uma legislação específica… vai ali no Google e resolve a questão. Mas e se a informação estivesse naquele código de processo tributário, na prateleira da sala do diretor? Isso já foi uma realidade. E olha que nem faz tanto tempo assim. Tem uns 20, 25 anos?

Nós nos habituamos a esse conforto, a essa boa vida que cada vez mais temos, que são oferecidas o tempo todo. E passamos a exigir isso em tudo que fazemos. A compra no e-commerce agora tem de ser em um clique. A geladeira que identifica itens em falta e já dispara um e-mail para avisar ou, ainda mais avançado, já realiza a compra no site de um grande varejista. O colchão ultramoderno já conectado com nossa cafeteira identifica que estamos levantando e emite um sinal para acionar a cafeteira para preparar o café, enquanto tomamos banho. Decorar o caminho para a casa do amigo, jamais. Liga o navegador GPS e ele diz como chegar até lá.

Não, não estamos falando dos Jetsons ou de um filme de ficção científica. Tudo isso já existe. Está em fase de testes e, no máximo, ainda não tem escala para garantir um preço acessível, mas deve ganhar o mercado muito em breve.

E há milhares de temas sobre essas mudanças que podem ser abordados. Estamos ficando mais preguiçosos e menos ativos? Queremos mesmo tudo nas mãos, sem a necessidade de muito empenho ou energia. Qual o custo social disso? Por outro lado, as facilidades proporcionadas pela tecnologia e internet de maneira geral também não liberam espaço para que exerçamos nossa produtividade de uma outra maneira, que a gente pense mais antes de agir e seja menos operacional e mais criativos?

Isso traz uma infinidade de desafios novos para a comunicação e o marketing das empresas. Essas mudanças provocadas pela tecnologia e pela internet são as melhores formas de materializar o conceito de que lidar com o público passa a ser uma questão de antropologia, sociologia, filosofia. Tecnologias da informação, comunicação e conexão tornam-se essencialmente meios. Elas são fundamentais, mas são apenas parte da entrega e da superação de expectativa dos clientes. Ainda mais se considerarmos os nativos digitais, que já nasceram, cresceram e caminham no mundo com tudo isso já fazendo parte de seu cotidiano, como algo natural da vida e, por essa razão, nem prestam atenção nisso.

Se algum profissional da área de comunicação e marketing ainda não percebeu isso, certamente vai sofrer. Quanto mais catracas criadas para o consumidor, quanto maior o número de obstáculos (na percepção do cliente) estiverem entre a marca e o relacionamento com seus públicos, quanto mais se exige dele, maior o esforço e menores as chances de conversão e resultados. Praticidade, simplicidade e facilidade passaram a ser comportamentos inerentes para a nova geração. E quem não direcionar suas iniciativas para esses três pilares, pode e deve perder mercado.

* Eduardo Vasques é head de mídias sociais da TV1.Com.