Estudo do Reuters Institute for the Study of Journalism levantou o percentual de pessoas não-brancas nos principais cargos de edição, com base em 100 organizações jornalísticas (online e offline) de cinco diferentes mercados: África do Sul, Alemanha, Brasil, Reino Unido e Estados Unidos.
O levantamento identificou que apenas 18% dos top editors nessas organizações são não-brancos – bem abaixo do percentual de não-brancos na população de uma maneira geral, que corresponde a 41%. Quando se tira a África do Sul da amostra, a situação é ainda mais grave, e o percentual de editores não-brancos nesses cargos cai para 6%.
No Brasil, país em que pessoas pretas representam mais da metade da população, foi identificado apenas um profissional não-branco nessa posição, dentro da amostra da pesquisa (5%). No Reino Unido e na Alemanha, nenhum (0%). Nos Estados Unidos, dois (11%). Só na África do Sul se verifica um percentual maior: 68% – mesmo assim, ainda abaixo da média da população não-branca no país, que equivale a 91%.
O estudo enfatiza como essa desigualdade impacta negativamente a produção e o consumo de notícias. A falta de pessoas não-brancas em posições de liderança implica, naturalmente, em decisões que limitam a diversidade das pautas e da cobertura jornalística. Isso também influencia a representatividade da população negra e a forma como os veículos e profissionais de comunicação são percebidos pela sociedade.
O instituto reconhece que há uma maior conscientização nesse setor sobre a importância de formar redações com maior diversidade de etnia e gênero, entre outros fatores. Mas alerta que esse movimento pode demorar a apresentar transformações significativas, principalmente diante das demissões associadas à crise econômica desencadeada pela pandemia de COVID-19.
A Verizon lançou recentemente o programa Citizen Verizon, que tem a promoção da diversidade como uma de suas vertentes, incluindo o combate ao racismo. Outros grupos de comunicação, como WPP, Publicis e Dentsu também divulgaram recentemente novos compromissos e programas nessa área.
Manifesto antirracista
A persistente desigualdade étnica na indústria da comunicação também é observada no setor de publicidade, como mostra a pesquisa-manifesto Before You Shoot, apresentada no LIONS Live, realizado de forma virtual no final de junho.
O estudo, produzido pela We Are Pi, analisou o racismo nos processos de casting, a partir de entrevistas com 500 pessoas dos setores de marketing, publicidade e produção comercial. Entre os respondentes, 70% afirmaram já ter testemunhado a exclusão de pessoas do casting por serem pretas; 52% disseram que foram ignorados ou calados quando tentaram intervir em decisões que consideraram racistas; e 70% revelaram que não há um ambiente seguro no trabalho para discutir temas como racismo e discriminação.
“Se posicione contra o racismo – senão você é cúmplice. Exija a presença de pessoas pretas em posições com poder de decisão. Construa um fórum seguro para a discussão do tema nas empresas”, convocou Alex Bennett-Grant, CEO da We Are Pi, durante o evento.
Outra pesquisa divulgada no LIONS Live destaca a necessidade de não apenas ter mais pessoas pretas no casting, mas de refletir sobre a forma como elas são apresentadas nas narrativas publicitárias. O estudo Bias & Inclusion in Advertising, produzido pelo Geena Davis Institute on Gender in Media, revelou que, nos anúncios premiados no festival Cannes Lions, é mais comum ver personagens brancos em locais de trabalho (como escritórios), e que eles costumam ser representados como mais sabidos do que as pessoas de cor.
No Brasil, levantamento da agência Heads sinaliza uma mudança positiva na representação de pessoas pretas na publicidade, mas ainda muito longe do ideal. De acordo com o estudo, o percentual de protagonistas negros em comerciais exibidos na televisão saltou de 1% em 2016 para 17% em 2019.
Na semana passada, a forma como os personagens pretos são construídos foi alvo de um intenso debate também na indústria cinematográfica, a partir de uma declaração do ator John Boyega, que interpretou Finn na série de filmes Star Wars. Em entrevista para a revista GQ, Boyega afirmou que os personagens dos atores brancos (como Adam Driver e Daisy Ridley) tinham muito mais proeminência e nuances do que o papel dele, e que Star Wars não sabia o que fazer com personagens não-brancos.