Dmexco reflete complexidade da transformação digital

Maior evento europeu voltado ao mercado digital coloca frente a frente líderes de empresas de tecnologia e gestores das maiores marcas do mundo

Os números impressionantes garantem ao Dmexco – Digital Marketing Exposition & Conference – o título de maior evento europeu do setor: mais de 50 mil participantes inscritos, 1.100 expositores e 570 palestrantes debateram nesta semana, em Colônia, na Alemanha, as oportunidades de negócios criadas pela revolução digital. Com ela, surgiram boa parte das empresas presentes na feira – das gigantes do Vale do Silício às startups de Berlim.

Na área destinada à exposição, stands mostraram robôs, experimentos baseados em Realidade Virtual e prototipagem de todos os tipos disputando espaço com salas de reuniões. O Dmexco é assumidamente um evento para business e, neste ano, se apresentou sob o tema Lightning The Age of Transformation.

Por isso, a organização convocou líderes de grandes anunciantes globais – e eles vieram em peso. Sinal de que, finalmente, as soluções Ad Techs ultrapassaram a barreira do departamento de TI e chegaram às salas do CEO e CMO. Era questão de tempo.

O DESAFIO

Ao unir as pontas do ecossistema no mesmo espaço, o Dmexco também deixou aflorar o tamanho do desafio que cerca a transformação digital. De um lado, anunciantes pressionados por resultados cada vez mais agressivos tentam identificar parceiros orientados por performance e transparência.

No outro, empresas de tecnologia moldam produtos, serviços e até a linguagem para conversar com o marketing. Estão começando a se entender, mas o vão que os separa traz para dentro também os grupos de comunicação.

Da Procter & Gamble, maior anunciante do mundo, veio o pedido para que seja criada uma nova geração de anúncios digitais. “Paramos de investir em anúncios de 30 segundos e estamos trabalhando em fazer anúncios que durem dois segundos. Está na hora dos profissionais de marketing e das companhias de tecnologia resolverem o problema dos anúncios irritantes e fazerem com que a experiência dos consumidores seja melhor”, disse Marc Pritchard, Chief Brand Officer Global da companhia.

Enquanto novos formatos são o maior desafio na opinião da P&G, comprovar os resultados do investimento em mídia digital está no topo da lista da Visa. “Escolhemos nossos parceiros pela capacidade que eles possuem de mostrar resultados para nosso negócio”, comentou Chris Curtin, Chief Brand and Innovation Marketing Officer da empresa.

Nesse sentido, ele provocou agências de publicidade a se remodelarem com áreas mais focadas em performance. “Ainda vemos poucas opções no mercado que trabalhem orientadas por dados e resultados agressivos. A nossa transformação enquanto anunciante passa também pela reinvenção das agências”, completou.

A resposta à provocação da Visa veio principalmente de dois grupos de comunicação: Dentsu Aegis Network e R/GA. No hub da DAN no Dmexco, demonstrações de protótipos baseados em Inteligência Artificial desenvolvidos internamente apontaram uma clara ressignificação do seu papel dentro dos clientes. São soluções para desafios de negócios, atendimento ao consumidor e logística de distribuição de produtos.

Já a R/GA subiu ao palco para mostrar sua visão de futuro – e o modelo que, segundo seu próprio fundador, Bob Greenberg, é o que faz sentido para os clientes. “Somos conectados e orientados pelo design thinking para desenvolver soluções, produtos e tecnologias para conectar pessoas e marcas de forma significativa”, garantiu.

AI, BOTS, VR … AFINAL, O QUE GERA NEGÓCIOS?

A pergunta permeou uma série de painéis que mostraram aplicações das tecnologias. A Adobe demonstrou o Sensei, camada de Inteligência Artificial que conecta os produtos de criatividade e marketing cloud da empresa, dando mais velocidade no processo de criação e gestão de campanhas.

O Google explorou as infinitas aplicações de Machine Learning, especialmente dos Bots que atuam na comunicação entre empresas e pessoas e se aprimoram a partir do aprendizado com os dados gerados. A empresa também apontou que cresce o uso de Realidade Virtual em tratamentos de saúde, treinamento de pilotos e outros fins que fazem os óculos de VR se tornarem soluções funcionais, e não somente extensões de campanhas.

A Samsung foi pela mesma linha e revelou que o download de aplicativos para os óculos Gear aumentou quase 180% nos últimos 12 meses. “Os nossos consumidores estão descobrindo que VR não é somente entretenimento. É solução para educação, saúde, cinema ou qualquer outro objetivo que as pessoas tiverem e que podem ser resolvidos pela experiência”, contou Marc Mathieu, CMO da Samsung para as Américas.

TECNOLOGIA, DADOS E A DISPUTA DE GIGANTES

Palco para anunciantes mas, principalmente, para as AdTechs, o Dmexco é um bom termômetro de posicionamento e discurso comercial das companhias.

Criada pela Verizon a partir da compra do AOL e Yahoo, a novata Oath nasceu há três meses com um portfólio de veterana: mais de 50 marcas de conteúdo, mídia e tecnologia para atingir dois bilhões de consumidores até 2020. A meta agressiva coloca a empresa no páreo com Google e Facebook pela busca de investimentos no digital.

“Não queremos ser uma terceira força de mídia na internet. Queremos ser a primeira”, disse John De Vine, Chief Revenue Officer. Ele já havia divulgado essa mesma meta durante o Cannes Lions, quando a Oath foi oficialmente apresentada ao mercado. Com modelo baseado em dados e conteúdo, a empresa propõe a construção de marcas em um ecossistema transparente e seguro.

FACEBOOK E OS PILARES DE CRESCIMENTO

O título do painel instigou – “O que garante o crescimento dos negócios no digital?” -, mas a resposta da CCO do Facebook, Sheryl Sandberg, foi morna quase fria. Para ela, marcas precisam focar na sua missão (entendendo por que existem); na construção de comunidades (essa é a garantia de engajamento positivo em torno de uma empresa) e, por fim, na comunicação sobre quem são (em diferentes formatos, preferencialmente vídeos).

Como não poderia deixar de ser, Sheryl reforçou a visão otimista do Facebook sobre o poder transformador da tecnologia na vida das pessoas. Como exemplo, citou o projeto brasileiro Walk Again que, a partir do uso de VR, estimula pacientes paraplégicos em tratamento a recuperar os movimentos das pernas. O discurso cronometrado e ensaiado não surpreendeu  quem disputou espaço no auditório principal do Dmexco.

E O TWITTER NÃO É MAIS UMA REDE SOCIAL

Foi o próprio cofundador da plataforma, Jack Dorsey, que disse com todas as letras no palco do Dmexco. “Não somos mais uma rede social. Somos uma plataforma de informação e conversas em tempo real, baseada em contexto como nenhuma outra”, disse a Martin Sorrel, CEO do WPP, que fez as vezes de entrevistador.

A dobradinha deveria ter acontecido no ano passado, mas Dorsey não pode vir a Colônia e acabou conversando com Sorrel via Skype. Choveram críticas e o evento tratou de trazer os dois pessoalmente neste ano. Valeu a pena.

A conversa correu em tom maduro e Dorsey respondeu com objetividade e sensatez às provocações feitas por Sorrel. A primeira delas rendeu a resposta que reposiciona o Twitter. Ciente de que é difícil brigar pelos investimentos de igual para igual com Google e Facebook, o Twitter corre por fora explorando a vocação para segunda tela.

Dorsey destacou que os usuários ativos da plataforma são relevantes e isso garante o ROI. “Estamos trabalhando para simplificar o jeito de anunciantes explorarem esse potencial e, acima de tudo, para provar que o investimento gera negócios”, revelou ao ser questionado sobre os próximos passos do Twitter, comprovando que nem mesmo quem transformou a forma de se comunicar passa ileso à necessidade de reinvenção.