TV Vida Real e a revolução inevitável que transforma marcas em publishers

Conteúdo ganha espaço nas agências e acelera fim da era da publicidade auto-centrada, analisa Eduardo Tracanella, superintendente de marketing institucional do Itaú

Na última quarta-feira, 15, o Itaú lançou a TV Vida Real, ação de conteúdo focada em jovens que precisam ser orientados sobre a proteção às suas finanças em um período complicadíssimo para a economia do país. Até há alguns poucos anos, as marcas convidavam jornalistas para apresentar campanhas publicitárias com grandiosos investimentos em mídia e que trabalhavam os features de seus produtos. Muita coisa mudou nesse meio tempo e de forma tão rápida que sequer percebemos. Esse novo projeto do Itaú tem algumas características peculiares que ajudam a explicar essa revolução silenciosa na publicidade dos últimos anos:

Aquele papo todo sobre a força do conteúdo… está acontecendo
O projeto foi pensado exclusivamente para os jovens, segmento que mais sofre com a crise. Para esse público em especial, é muito mais relevante se engajar com marcas que ofereçam conteúdo com visão de entretenimento e a presença da youtuber Nathalia Arcuri (do canal Me Poupe) do que marcas que entreguem um comercial publicitário que venda sonhos de vida feliz emulados em um determinado produto, como um cartão universitário, por exemplo.

Aos poucos e devagar, agências estão se adaptando
A ação foi criada pela DPZ&T, que tem o DNA das tradicionais agências DPZ e Taterka. No segundo semestre do ano passado, a agência reformulou seu histórico setor de mídia, meses após a saída de Flavio Rezende (anunciada em março de 2016). A área foi unificada ao departamento de planejamento estratégico e ao novo setor de… sim, conteúdo.

Com esse formato, a distribuição não é guiada apenas pelos mantras de compra, compra e compra da área de mídia, e sim pela personalização de acordo com os objetivos estratégicos de cada ação.

Fui falar com os responsáveis pela TV Viva Real para entender se eles concordavam com essas visões. Não pessoalmente, já que a campanha foi lançada em um dia de caos em São Paulo, mas, por e-mail. Vejam o que disse Eduardo Tracanella, superintendente de marketing institucional do Banco Itaú, o profissional de marketing mais admirado do Brasil, segundo o Agency Scope 2016:

“A relação das pessoas com as marcas mudou muito. O novo consumidor busca identificação e significado nessa relação. Desse modo, o discurso auto-centrado que nunca funcionou, funciona cada vez menos. Construir conteúdo relevante e didático, com formatos diferentes e atrativos, para informar e empoderar os clientes, é um dos caminhos mais importantes para a construção de relações mais fortes e sustentáveis”, disse, lembrando que desde 2004 o Itaú investe em campanhas para uso consciente do dinheiro.

Entretenimento e conteúdo: territórios novos
Tracanella demonstrou grande interesse em esclarecer que a produção de conteúdo em múltiplos canais não é novidade e ocorre há quatro anos no Itaú. De fato, diversas marcas e agências têm feito projetos com visão de conteúdo nos últimos anos. A questão é que esse tipo de iniciativa está se tornando protagonista.

A própria DPZ&T anunciou na mesma semana uma ação para McDonald´s focada em entretenimento e conteúdo: uma mini-novela inspirada em folhetins mexicanos produzida em parceria com a Globosat e veiculação nos canais da programadora: “Guacamole da Paixão”. O objetivo é divulgar o lançamento do sanduíche Original Mex, uma estratégia que, a propósito, também contará com um comercial de 30 segundos.

Além de Tracanella, falei com Sérgio Mugnaini, diretor executivo de criação contratado pela agência em agosto do ano passado e que foi o porta-voz da DPZ&T na ação do Itaú. O que foi interessante para entender a visão da criação sobre os impactos da revolução do conteúdo na linguagem da publicidade:

“O Brasil bebe da mesma fonte que todos os demais países onde a produção de conteúdo pelo cinema, redes sociais e, principalmente, influenciadores acabam servindo de referência para algumas marcas aproximarem seu discurso a um target desejado”, analisou.

No caso específico de TV Vida Real, a intenção da DPZ&T foi sair do discurso “professoral” dos bancos, que acabam explicando o que o consumidor já sabe: que ele está numa enrascada financeira. “Brasileiros costumam ser bem-humorados quando estão no meio de um problema, o que nos levou a olhar sob o ponto de vista de “entretenimento financeiro”, ao invés de “educação financeira””, diz.

Evidentemente, a linguagem tradicional da propaganda ainda é importante e ocupa espaço grande do budget das marcas. Mas vai dividir cada vez mais espaço com ações de conteúdo como essa de Itaú. “Sobre os caminhos da propaganda no Brasil, acredito sim que vamos ver, cada vez mais, marcas experimentando territórios novos, até para explorar as linguagens disruptivas que a própria sociedade tem adotado”, avisa Tracanella.

 

https://www.youtube.com/watch?v=-2r2CQ3BrrA