Cannes Insights: em Glass, empatia é fundamental para não cair no vazio

Andrea Alvares, da Natura, diz que discursos sem legitimidade ficarão fora da disputa por Leões na categoria

Um dos principais profissionais envolvidos no Grand Prix de Glass Lions do Festival de Cannes no ano passado foi Ashish Patil, da Y-Films – apontado pelo Advertising Age como “o homem por trás da campanha”. A ideia baseou-se na criação de uma banda com seis pessoas transgênero, a “6 Pack Band” – que, aliás, será uma das atrações no evento deste ano. O objetivo foi promover o conceito de “unir as pessoas”, para a marca Brooke Bond Red Label, da Unilever.

A campanha foi um sucesso. Ashish, no final das contas, personificou a principal característica para alguém que deseja ser bem-sucedido em Glass Lions: empatia.

Representante do Brasil no júri, Andrea Alvares, vice-presidente de marketing da Natura, defende que é difícil para alguém que não esteja pensando no assunto conscientemente tratar dele – e entender as dores e dificuldades envolvidas. “Há muita chance de errar. Mas isso não significa que um homem não pode criar uma campanha que promova o empoderamento feminino, por exemplo. Mas é preciso ter a humildade de reconhecer que você não pertence àquele público e que tem muito dever de casa a fazer”, afirma.

Andrea reforça que, antes de emitir uma opinião ou criar pensando em determinado público, é preciso reconhecer que não sabe. “Só depois, se abrir de fato ao assunto e, por fim, fazer um enorme exercício de empatia”, completa.

Grande parte dos trabalhos que serão avaliados por Andrea e os demais membros do júri tende a cair fora da disputa pelos troféus por causa disso. Discursos sem legitimidade estão na mira. “Glass Lions é uma área muito rica, mas é fácil uma marca pode cair no vazio se não for autêntica, verdadeira. Não se pode tentar ter um discurso, ainda mais se for ativista, se não for profundamente verdadeiro. Tem que acreditar que aquilo faz sentido e que tem papel de transformação naquela causa”, analisa.

Glass Lions precisa existir
Andrea diz que ficou feliz de ir a Cannes para avaliar o Glass Lions pois tem a pauta do empoderamento feminino como projeto de vida. “A publicidade é uma indústria que precisa olhar desesperadamente para o gap de gênero que ainda existe e ter um plano para diminuir essas diferenças”, analisa.

“Quando tivermos metade dos júris formados por mulheres (a porcentagem cresceu em 2017, mas ainda não chegou à equidade), talvez Glass Lions não seja mais necessária. Mas ainda existe uma diferença tão gritante que você precisa de uma ação afirmativa como essa categoria”, acredita Andrea.

O Glass Lions, diz, funciona como uma lente sobre o fato de alguns segmentos como as mulheres serem sub representados na indústria. “Se optarmos pela inércia, e não ter uma categoria como essa, vai demorar 80 anos para as coisas se igualarem. Essa categoria provoca discussão, cria consciência e ajuda a mudar as coisas de forma mais rápida”, avisa.